Quando vires os teus olhos a verem-te, quando não souberes se tu és tu ou se o teu reflexo no espelho és tu, quando não conseguires distinguir-te de ti, olha para o fundo dessa pessoa que és e imagina o que aconteceria se todos soubessem aquilo que só tu sabes sobre ti.

José Luis Peixoto

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Cativa-me

"- Quem és tu? - perguntou o principezinho - És bem bonita...

- Sou uma raposa - disse a raposa.

- Anda brincar comigo - pediu-lhe o principezinho - Estou tão triste...

- Não posso ir brincar contigo- disse a raposa- Ainda ninguém me cativou...

- AH! Então, desculpa! - disse o principezinho.

Mas pôs-se a pensar, a pensar, e acabou por perguntar.

- "Cativar" quer dizer o quê?

- Vê-se logo que não és de cá - disse a raposa - de que andas tu à procura?

- Ando à procura dos homens - disse o principezinho. - "Cativar" quer dizer o quê?

- É uma coisa de que toda a gente se esqueceu - disse a raposa. - Quer dizer "Criar laços"...

- Criar laços?

- Sim, laços - disse a raposa. - Ora vê, por enquanto tu não és para mim senão um rapazinho perfeitamente igual a cem mil outros rapazinhos. E eu não preciso de ti. E tu também não precisas de mim. Por enquanto eu não sou para ti senão uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativares, passamos a precisar um do outro. Passas a ser único no mundo para mim. E eu também passo a ser única no mundo para ti...

Estás a ver aqueles campos de trigo ali adiante?

Eu não gosto de pão e, por isso, o trigo não me serve para nada. Os campos de trigo não me fazem lembrar nada. E é uma triste coisa! Mas os teus cabelos são da côr do ouro. Então, quando tu me tiveres cativado, vai ser maravilhoso! O trigo é dourado e há-de fazer-me lembrar de ti. E hei-de gostar do som do vento a bater no trigo...

A raposa calou-se e ficou a olhar para o principezinho durante muito tempo.

- Se fazes favor... Cativa-me! - acabou finalmente por pedir.

- Eu bem gostava - respondeu o principezinho, - mas não tenho muito tempo - tenho amigos para descobrir e uma data de coisas para conhecer...

- Só conhecemos o que cativamos - disse a raposa - Os homens deixaram de ter tempo para conhecer o que quer que seja. Compram as coisas já feitas aos vendedores. Mas como não há vendedores de amigos, os homens deixaram de ter amigos. Se queres um amigo, cativa-me!

- E tenho de fazer o quê? - disse o principezinho.

- Tens de ter muita paciência. Primeiro, sentas-te longe de mim, assim, na relva. Eu olho para ti pelo canto do olho e tu não dizes nada. A linguagem é uma fonte de mal entendidos. Mas podes-te sentar cada dia um bocadinho mais perto...

O principezinho voltou no dia seguinte.

- Era melhor teres vindo à mesma hora - disse a raposa.

- Por exemplo, se vieres às quatro horas, às três, já eu começo a estar feliz - E quanto mais perto fica da hora, mais feliz me sinto. Às quatro em ponto hei-de estar toda agitada e toda inquieta: fico a conhecer o preço da felicidade! Mas se chegares a uma hora qualquer, eu nunca vou saber a que horas hei-de começar a arranjar o meu coração, a vesti-lo, a pô-lo bonito...

(...) O principezinho foi ver as rosas outra vez.

- Vocês não são nada parecidas com a minha rosa. Vocês ainda não são nada. Não há ninguém cativado por vocês e vocês não estão cativadas por ninguém. Vocês são como a minha raposa era. Era uma raposa perfeitamente igual a outras cem mil raposas. Mas eu tornei-a minha amiga e, agora, ela é única no mundo.

As rosas ficaram bastante incomodadas. - Vocês são bonitas, mas vazias – ainda lhes disse o principezinho. Não se pode morrer por vocês. Para uma pessoa qualquer, a minha rosa é perfeitamente igual a vocês. Mas, sozinha, vale mais do que vocês todas juntas, porque foi a ela que eu reguei. Porque foi a ela que eu pus debaixo de uma redoma. Porque foi a ela que eu abriguei com o biombo. Porque foi a ela que eu matei as lagartas (menos duas ou três, por causa das borboletas). Porque foi a ela que eu ouvi queixar-se, gabar-se e, até às vezes, calar-se. Porque ela é a minha rosa.

E então voltou para o pé da raposa e disse: - Adeus…

- Adeus – disse a raposa. Vou contar-te o tal segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos...

O essencial é invisível aos olhos – repetiu o principezinho para nunca mais se esquecer.

Foi o tempo que perdeste com a tua rosa que tornou a tua rosa tão importante.
- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa... - repetiu o principezinho para nunca mais se esquecer.

Os homens já se esqueceram desta verdade – disse a raposa. Mas tu não te deves esquecer dela. Ficas responsável por todo o sempre por aquilo que cativaste. Tu és responsável pela tua rosa...

- Sou responsável pela minha rosa... - repetiu o principezinho para nunca mais se esquecer."

5 comentários:

Carlinha disse...

Muito bom post...retirado dos mais simples e fantasticos livros k li ate hj...
De tao simples leitura e de tao dificil compreensao para mtas pessoas!
Aki está uma das partes findamentais!...Akela k s aplica ao comum humano com verdadeiros sentimentos...

Tudo isto foi o k m aconteceu...Tudo!
Fiz asneira...agr "pago" pelo k fiz...o arrependimento nao mata...((in)felizmente!)

Fica bem!*

Ana disse...

Carlinha: Ficas responsável por aquilo que cativaste! E, se o que cativaste não parece mais teu, cativa novamente. E cativa-te a ti própria =D

. disse...

a passagem mais bonita do principezinho ;)

bom cantinho que aqui tens ;)

Rabisco disse...

O Principezinho seria uma lição de vida para muito "boa gente".

Ana disse...

The girl whose...: obrigada! volta sempre =D

Rabisco: e por vezes são precisas lições assim. que nos lembrem do que é realmente importante.